Conseqüências do uso da maconha
Recentemente têm ocorrido várias discussões a respeito da possibilidade de se legalizar, não apenas o uso medicinal da maconha, mas também o seu uso recreativo. Um artigo recente publicado no prestigioso The New England Journal of Medicine tratou de forma adequada e cientificamente válida de suas conseqüências para a saúde.
A forma mais comum de administração da maconha é pela inalação. As folhas e flores verde-acinzentadas da Cannabis sativa, junto com seus galhos e sementes, são fumados em cigarros, charutos ou outras formas de uso inalatório.
O uso da maconha na adolescência é particularmente preocupante, pois nessa faixa de idade que a probabilidade de conseqüências deletérias é maior.
As evidências atuais indicam claramente um risco de dependência da maconha, de forma que 9% das pessoas que a experimentam se tornam dependentes. Essa proporção passa a quase 20% (1/6) entre pessoas que iniciam o uso na adolescência e fica entre 25 e 50% para pessoas que fazem uso diário. Existe a descrição de um síndrome de abstinência, com irritabilidade, dificuldade de sono, desejo intenso de uso e ansiedade que torna a interrupção do uso difícil, contribuindo para a recaída.
O cérebro está em estado de desenvolvimento do período pré-natal até por volta dos 21 anos, e durante esse período ele é mais vulnerável aos efeitos de longo prazo da exposição ao THC (tetrahidrocanabinol, substância ativa da maconha). Adultos que fumaram maconha durante a adolescência têm conectividade neuronal diminuída (menos fibras e menos conexões) em várias áreas do cérebro, inclusive áreas relacionadas a atenção, consciência, aprendizado e memória. Essas observações auxiliam no entendimento de um dado anterior de que pessoas que usam regularmente a maconha a partir da adolescência tendem a ter níveis menores de inteligência (QI).
É um dado epidemiológico válido o de que o uso de maconha na adolescência pode influenciar múltiplos comportamentos de dependência na idade adulta. Em experimentos com roedores, observou-se que a exposição à maconha durante a adolescência altera o sistema de recompensa. Também são observadas alterações em vias de dopamina relacionadas a dependência em experimentos envolvendo filhos com exposição intra-útero a maconha. Esse efeito poderia ser uma explicação para a maior suscetibilidade a abuso e dependência de outras drogas em usuários de maconha. (Quer saber mais sobre o sistema de recompensa? Clique aqui).
O uso de maconha está associado a um risco aumentado de depressão e ansiedade, bem como de psicoses (incluindo esquizofrenia), especialmente em pessoas com uma predisposição genética. Além disso, pode influenciar o curso de doenças como a esquizofrenia (Quer saber mais sobre esquizofrenia, Clique aqui), exacerbando os seus sintomas e podendo adiantar um primeiro surto psicótico em 2 a 6 anos.
Uma vez que a maconha reduz níveis cognitivos durante a intoxicação aguda e por alguns dias após, é possível que um grande número de estudantes “funcionem" abaixo do seu nível cognitivo por longos períodos de tempo, já que a usam de forma freqüente, estando por isso sempre sob os seus efeitos agudos.
O risco de acidentes automobilísticos é sabidamente aumentado em pessoas com uso de maconha, e ainda maior em pessoas com uso concomitante de maconha e álcool.
A tabela ao lado resume alguns dos efeitos deletérios do consumo de maconha para o organismo. Vale ressaltar que esse texto é um alerta em relação ao tipo de prejuízo que a maconha causa para o organismo. Não é a minha intenção neste momento fazer um julgamento ou elaborar uma opinião a respeito da legalização da droga para consumo recreativo, já que nessa discussão está incluída uma série de outros pontos não abordados aqui.
Bibliografia: Adverse Health Effects of Marijuana Use (Nora D. Volkow, M.D., Ruben D. Baler, Ph.D., Wilson M. Compton, M.D., and Susan R.B. Weiss, Ph.D.) - New England Journal of Medicine - 370;23 - June 5, 2014